quinta-feira, 2 de junho de 2016

Creio em Deus Pai Todo-Poderoso: "O risco de Dilma voltar"

HELIO GUROVITZ


A presidente afastada Dilma Rousseff pode voltar ao poder? Sim, o risco existe e tem crescido desde que Michel Temer assumiu o lugar dela. Há três motivos que tornam a volta de Dilma mais provável hoje do que era no dia em que ela deixou a presidência, menos de um mês atrás.

O primeiro motivo é aritmético. Dilma ainda não foi julgada. A previsão é que isso aconteça no início de agosto. Para que os senadores a condenem por crime de responsabilidade, são necessários 54 votos. Mas nem todos os 55 senadores que votaram pela abertura do processo contra ela votarão pela condenação.

Na conta das desistências, basta que dois mudem de ideia para que ela seja absolvida. Na conta das adesões, há entre 40 e 45 votos certamente favoráveis à condenação. Para considerar Dilma culpada, será preciso, num cenário otimista, convencer pelo menos outros nove. A conta das desistências bem é mais favorável que a das adesões.

Isso ocorre em parte pelo segundo motivo, de ordem política. O governo Temer começou mal. Já perdeu dois ministros e ainda não conseguiu convencer o país de que recuperará o fôlego da economia, que ontem registrou sua maior contração acumulada em décadas. Temer tem se mostrado hesitante, faz e desfaz seus atos à menor pressão, da extinção do ministério da Cultura à suspensão de obras do programa Minha Casa, Minha Vida.

A principal fraqueza do governo Temer foi explorada pelo advogado de Dilma, José Eduardo Cardozo, na defesa que entregou ontem ao Senado. Ele diz que o processo foi contaminado por interesses de investigados na Operação Lava Jato. É fato que alguns viam o impeachment como modo de deter as investigações, como comprovam as gravações reveladas na delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.

A verdade plena é distinta, claro. O impeachment resultou de manifestações populares, da inépcia política de Dilma, de sua incompetência como gestora e das fraudes fiscais que cometeu. Ela foi afastada pelo voto de 367 deputados e 55 senadores que, por mais que estejam contaminados por denúncias, receberam, por meio do voto popular, a legitimidade para tomar a decisão que tomaram.

A tramoia daqueles que conspiravam pelo fim da Lava Jato também deu errado, pois a operação continua a todo vapor. No plano da percepção, contudo, as gravações funcionam a favor de Dilma. Conferem um ar de credibilidade à narrativa petista, de que “os corruptos deram um golpe contra ela para se livrar”. Como se alguém tivesse se livrado, ou como se o PT não tivesse corruptos… 

Há, enfim, um terceiro motivo que aumenta a probabilidade de volta de Dilma. Ele também é político, mas não tem a ver com o governo Temer. Ela dispõe de uma carta na manga para convencer senadores a não votar pela condenação: prometer que, se voltar, convocará eleições gerais antecipadas.

Diante do derretimento na credibilidade do Congresso, alvejado pela Lava Jato e incapaz de reagir à altura (até quando Cunha, até quando?), a antecipação das eleições, por meio de emenda constitucional, pode ser vista como uma solução de compromisso por aqueles interessados em salvar as aparências – entre os quais Dilma, que perderia o poder, mas seria absolvida. Novas eleições não estão na regra do jogo. A antecipação é uma medida oportunista. Mas teria mais credibilidade perante a opinião pública que qualquer “acordão de bastidores”.

O fator decisivo para a volta de Dilma será, no fim das contas, o desempenho de Temer. Ele tem o governo na mão e pode exercer sobre os senadores todo tipo de afago e pressão permitidos pela caneta presidencial. Sua equipe econômica é competente e tem condição de apresentar reformas e políticas capazes de mudar o humor dos mercados em relação ao Brasil.

Bastará a sensação de que as coisas estão melhorando, de que os ventos voltaram a soprar a favor do país, para que o sentimento em relação a Temer melhore. E os senadores serão astutos o bastante para perceber de que lado deverão ficar. Ajudaria bastante se, além disso, Temer fizesse uma faxina em sua equipe, tirando os conhecidos suspeitos de sempre, e se demonstrasse mais consistência em suas decisões. Claro que, para conseguir, Temer talvez precisasse deixar de ser Temer.

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