segunda-feira, 3 de abril de 2017

Itamaraty orienta embaixadas a promover venda de armas do Brasil

PATRÍCIA CAMPOS MELLO
DE SÃO PAULO


O Itamaraty está orientando as embaixadas brasileiras a promoverem a venda de armas fabricadas no Brasil. Uma circular enviada às representações do país no exterior, obtida por meio da Lei de Acesso à Informação pelo Instituto Sou da Paz e pelo Instituto Igarapé, determina que a indústria de defesa e de armamentos será prioridade para promoção comercial do Brasil em 2017.

Enviado em 6 de dezembro de 2016, o texto insta diplomatas a promover eventos, missões empresariais e seminários "com o fim de incentivar as exportações de brasileiros dessa cadeia (da indústria de defesa)".

"Atualmente, a indústria de defesa brasileira apresenta baixo grau de internacionalização...Para ganhar escala e contar com um mínimo de previsibilidade na produção, é imprescindível que as empresas brasileiras conquistem mercados no exterior", diz a circular. O Itamaraty instrui os diplomatas a se focarem em países da Europa, Ásia, Oriente Médio e África como mercados para produtos da indústria de defesa.

Para entidades de direitos humanos como o Instituto Sou da Paz, é irresponsável o governo brasileiro incentivar um aumento das exportações de armas sem antes aperfeiçoar o processo de concessões de licença de vendas.

"Não somos contra o incentivo à indústria da defesa, mas nos preocupa o controle inadequado das vendas de armas no exterior", diz Bruno Langeani, coordenador da área de Justiça do Sou da Paz "É preciso garantir que o comprador final não está em um país em guerra e que consegue garantir a segurança dos armamentos."
Reprodução

Pedaço de foguete brasileiro tipo cluster achado no Iêmen


Segundo Langeani, a avaliação de risco feita pelo governo brasileiro é insuficiente e, por isso, muitas armas brasileiras acabam em países em conflito ou sob embargo internacional. Ele cita dois exemplos recentes: pistolas Taurus que foram vendidas para o filho de um traficante internacional de armas; e as bombas de fragmentação brasileiras usadas pelas forças sauditas na guerra do Iêmen.

Relatório do Painel sobre o Iêmen para o Conselho de Segurança da ONU, de 31 de janeiro, afirma que a fabricante brasileira Forjas Taurus enviou em 2015 um carregamento com 8 mil armas a um filho do iemenita Fares Mohammed Mana'a, um conhecido traficante internacional.

Isso ocorreu três meses após a ONU impor um embargo de venda de armas ao Iêmen, dado o conflito no país. O relatório aponta falhas do governo brasileiro ao conceder a licença de exportação.

A venda autorizada era de 80 mil pistolas para o Ministério de Defesa do Djibuti, um pequeno país africano, que só tem 16 mil militares na ativa e 9,5 mil reservistas.

As pistolas provavelmente eram direcionadas à Somália, também sob embargo. Segundo a ONG Human Rights Watch, foguetes tipo cluster brasileiros foram usados nos últimos meses pelo menos quatro vezes pela coalizão liderada pela Arábia Saudita no Iêmen, matando dois civis e ferindo ao menos 10. Os foguetes são fabricados pela indústria brasileira Avibrás.

As bombas de fragmentação provocam muitas mortes entre civis porque se desfazem em inúmeros explosivos após serem lançadas.

CONTROLE RIGOROSO

As exportações de materiais de uso militar dependem de autorização governamental, e "o procedimento de aprovação leva em consideração os princípios da política externa brasileira, entre eles o respeito aos direitos humanos", diz o Itamaraty.

Em nota, o ministério afirma que se trata de processo "rigorosamente controlado" pelas pastas da Defesa e das Relações Exteriores. "Por meio dessa exigente avaliação, não são autorizadas exportações de material brasileiro de defesa para países em conflito, bem como para países objeto de sanções internacionais."

A Taurus afirmou que, na transação com o Djibuti, "não tinha elementos que a permitissem suspeitar dos compradores e, assim, não pode ser responsabilizada por intenções que ela desconhecia".

"Assim que tomou conhecimento das suspeitas relativas a essa venda, a Taurus suspendeu a transação, assim como quaisquer outras operações envolvendo o Djibuti."

A Avibrás foi procurada, mas não respondeu

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