sábado, 10 de junho de 2017

Fatos novos tinham que ser julgados




Em entrevista à DW, ex-presidente do STF Sydney Sanches afirma que julgamento no TSE tem sido técnico, sem argumentos políticos. Mas critica não inclusão de delações de executivos e marqueteiros no processo.



Sessão no TSE: ministros devem decidir pela absolvição da chapa Dilma-Temer


O julgamento da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entra nesta sexta-feira (09/06) na reta final, e as manifestações preliminares indicam a não inclusão de depoimentos de ex-executivos da Odebrecht e de marqutereiros do PT no caso, o que facilita a absolvição.

Em entrevista à DW, o ex-presidente do Superior Tribunal Federal (STF) e do TSE Sydney Sanches avalia que o julgamento tem apresentado questões técnicas, deixando os ecos da atual crise política de fora das alegações dos sete magistrados que julgam a ação.

Responsável por conduzir o impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello no STF, em 1992, Sanches compartilha da posição do relator Herman Benjamim de incluir os fatos obtidos a partir das delações premiadas da Odebrecht e dos marqueteiros do PT na campanha de 2014.

"Fica parecendo, para a opinião pública, que a causa julgada não foi julgada por inteira, porque as denúncias feitas por eles são seríssimas, e não foram levadas em consideração por uma questão processual", afirma.

DW: Como o senhor tem visto o julgamento até o momento?

Sydney Sanches: A questão principal está em torno da validade das delações premiadas obtidas após a conversão do julgamento em diligência, pelo tribunal, se elas devem ou não ser aproveitadas. Parece que elas já foram afastadas, por 4 a 3. Agora, no mérito ainda não há uma definição, mas acho que o resultado será o mesmo. Quanto ao julgamento em si, há outro aspecto importante: essa não é uma ação igual às outras. É atípica. É uma ação em que a própria Justiça investiga.

Sydney Sanches: "Tudo nessa situação faz com que o país fique paralisado"

Se tem o poder de investigar, tem que se investigar todos os fatos, tendo em vista que na petição inicial foram apenas expostos os fatos que se tinham conhecimento naquele momento, mas que podiam ser levados em consideração os fatos possivelmente apurados no futuro. O que me surpreendeu foi o que o tribunal adiou um julgamento para colher os depoimentos dos marqueteiros [João Santana e Monica Moura, marqueteiros do PT na campanha presidencial de 2014] e do Marcelo Odebrecht e depois concluiu que eles não poderiam ser utilizados. Então por que eles foram ouvidos? Fica parecendo, para a opinião pública, que a causa julgada não foi julgada por inteira, porque as denúncias feitas por eles são seríssimas, e não foram levadas em consideração por uma questão processual.

O relator Herman Benjamim tem utilizado o argumento de que depósitos bancários, anteriores a 2014, geraram uma espécie de ‘'gordura da corrupção'', o que resultaria em vantagem econômica na disputa das eleições presidenciais e, portanto, seria ilegal. A defesa de Dilma Rousseff e Michel Temer diz que os fatos não podem ser julgados, porque foge do mérito. O argumento do relator é válido?

É bem possível que os partidos tenham recebido quantias antes de 2014, e tenham aproveitado esse dinheiro na campanha de 2014. De maneira que não se pode dizer que é despropositado esse entendimento do relator. Agora, a objeção de que isso aconteceu antes da eleição, é válido. Há esse contraponto. É difícil dizer quem tem razão nesse ponto. O que me convenceu mais foi a alegação do relator Benjamim.

Como ex-presidente do STF e do TSE, qual seria o seu posicionamento nesse julgamento?

É difícil dizer, porque ainda não acompanhei os votos dos demais ministros sobre o mérito. Eu apenas me convenci do acerto desse ponto do relator [gordura da corrupção influenciou 2014]. Mas vale ressaltar que o julgamento tem sido técnico até aqui. Ainda que tenha havido alguma inspiração política, elas não ficaram expressas nos votos. Eles não ponderaram ‘'será bom para o país'', ‘'não podemos permitir que o Brasil fique nessa crise. Isso são argumentos políticos. E respeitáveis. O que se deve pensar é: o ponto de vista político deve prevalecer sobre o ponto de vista jurídico? Essa é a questão. Mas, até aqui, o julgamento tem sido técnico. O que me surpreende é a postura do ministro Gilmar Mendes em não admitir a inclusão de novos fatos ocasionados no curso do processo.

Como o senhor avalia a ação do ministro Gilmar Mendes como presidente do TSE? Há um excesso em decisões de cunho político?

Nesse julgamento, ele tem se detido apenas a aspectos técnicos. Ele não fez nenhuma afirmação do que convém ao país, do que pode ser bom para o Brasil. Agora, o que não deixa de pesar em relação ao voto do ministro Gilmar Mendes é que ele havia indicado que havia já indícios de abuso de poder econômico. Quando foi alterada a decisão da relatora inicial, a ministra Maria Teresa, ele foi acompanhado por toda mesa, alegando a necessidade de julgar ‘'os fatos novos''. Então que se julgue os fatos novos.

Concretizada a permanência de Michel Temer, como o senhor acha que o país sai desse julgamento?

Nós estamos numa crise que vai se complicando cada vez mais. Mesmo que o TSE conclua que não deva cassar a chapa Dilma-Temer, o presidente da República está sendo investigado pelos fatos que foram apresentados nas delações da JBS. Se houver denúncia, ficará uma situação insustentável: um presidente da República processado criminalmente no STF, ainda que não tenha sido julgado. Ainda que o STF precise da liberação da Câmara dos Deputados para prosseguir. É uma espécie de freio ao poder do Judiciário, prevista na Constituição. Isso tudo provoca mais crise ainda. Ele sempre foi tido como um dos grandes políticos do país, de grande expressão e, de repente, se vê humilhado pela situação que foi encontrado. Conversar com um empresário, altas horas da noite, com ele dizendo que comprou procuradores da justiça, com juízes, e ele apoia. Tudo nessa situação faz com que o país fique paralisado.

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